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terça-feira, 26 de julho de 2011

AS MULHERES QUE NUNCA TIVE PELO MEU MELHOR AMIGO: Cristina

Cristina era tinto, adorava poesia e vinho. Tive a certeza ao ver tantas rolhas guardadas na casa do meu amigo e da história contada por ele. Chegavam perto de 80. Não perguntei quanto tempo ficaram juntos, mas imaginei: Devem ter tomado uma garrafa a cada encontro, logo, se viram 80 vezes! Mas se estavam com mais sede podem ter tomado duas, então a conta caía pra 40. E se a conversa ficou mais apimentada, ou a vontade de pecar foi maior, poderiam ter tomado vinho escorrido e consumido 3 ou 4 garrafas em cada encontro. Fiquei sem jeito de perguntar essas coisas, mas deve ter percebido que eu fazia contas e sacou logo dizendo: “Nem sempre tomávamos vinho, mas na maioria das vezes bebíamos vendo um filme, conversando ou fazendo comida”. Cris é garrafa de vinho de contornos longilíneos, de se perder na extensão verticalizada, embora vinho, para continuar bom, precise ser armazenado em posição horizontal, e, sua melhor performance eram em locais de baixa luminosidade. Ela é assim, sempre a meia luz, intensidade de embebedar rapidamente, quem não a conhece se perde, quando a conhece, aprecia. Ela é festa para todas as vontades de um homem, disparo de gosto para todos os sentidos, fantástica plasticidade e veneno sinuoso. É como um bom vinho, recheado de partículas de suspensão que não são visíveis através do vidro, sendo preciso sorvê-lo completamente para sentir-se digno como um rei. Mas o ritual predileto dela era ouví-lo recitando. Era assim: ele tinha que chegar às 21 horas em ponto, depois das muitas atividades cotidianas. Não havia data certa, mas no dia que recebesse uma mensagem em seu celular, deveria ir ao seu encontro. Na mensagem constava apenas “o nome de um país”. A partir daí sabia o que fazer, corria à estante, visitava as suas antologias e já sofria, porque o martírio era rasgar a página do livro com a escolhida. A pessoa era incisiva, dizia: “O poema tem que ser ofertado, é como tomar uma garrafa de vinho, não tem mais volta”. Era uma sincronia entre recitação e degustação: pausas, aromas, intenções, paladar, metáforas, embriaguez, ritmo, brinde, voz ao pé do ouvido e letargia plena!  Rolhas e poesias em potes. Ela, ficava com as páginas amassadas dos poemas lidos, ele, levava as rolhas pra casa. Me disse sorrindo: dei a volta ao mundo em em 80 rolhas amigo! - mas só me contou do Chile, recitando Neruda: Bebo vinho do teu corpo / Devagar e quase a medo / Na surpresa dos segredos / Copos cheios de prazer”... Boca a boca, beijo a beijo! (J. S e A. Z. Silva)

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quinta-feira, 21 de julho de 2011

AS MULHERES QUE NUNCA TIVE PELO MEU MELHOR AMIGO: Olga ou Iolanda


  Mulher Sexy
 Tinha nome de filme nacional ou de música conhecida. Fiquei na dúvida se seu nome era Olga ou Iolanda, talvez porque ela era muitas em uma. O nome nessa história não é tão importante quanto os fatos. Eduardo Galeano no “Livro dos abraços” fala algo como: “Se é verdade, ou não, toda história passa a ser real no momento em que está sendo contada”. Meu amigo me contou que na primeira vez que se viram, errou todo um roteiro que estava decorando para uma apresentação escolar. Estudaram juntos  no ensino médio. Ele já estava naquele colégio desde o fundamental, ela, veio transferida não se sabe de onde, mas apareceu num dia de aula, e de repente estava lá, presente e chamativa, de poucas palavras mas de flertes fatais, dos que desnorteiam, que te pegam desprevinido e te deixam sem jeito. Quando bateu os olhos na criatura a perna bambeou. De lá em diante, todos os intervalos passaram juntos, rindo de tudo. Nessa época meu amigo morava com seus pais, nem tão conservadores, mas protetores em demasia ao ponto de acordarem de madrugada para esquentarem a comida imaginando que ele havia chegado com fome. Descobria a vida e os prazeres com ela, perdendo a hora de chegar em casa, de acordar pra ir trabalhar, de contar as horas pra chegar na escola. Mas todo ano letivo acaba, assim como uma partida de futebol, um campeonato, um pacote de salgadinho, um livro que te prende. Passada a formatura se viram uma ou duas vezes. Veio a faculdade, novos amigos, novos caminhos e a figura, sumiu, como se tivesse desaperecido na névoa de Paranapiacaba depois das 5 da tarde. E virou um ano, outro, outro e mais 8. Num dia de sol numa praça no centro da cidade, com prostitutas cansadas e de idade avançada abordando trabalhadores, vagabundos e gente de toda sorte, de ambulantes vendendo tudo que se possa imaginar (cd, dvd, comeu morreu, Jesus me chama), de charlatões com seus ungentos, de pregadores evangélicos gritando até perderem a voz, batendo na bíblia e dizendo: todo mundo tem que ter as Sagradas Escrituras em casa, leiam a biblia ao invés de gibis... ela passava em frente a banca de jornal... fiquem atentos com os lobos pois o mundo está cheinho deles... ele fixou seus olhos, quase desacreditando no que via... convencem as ovelhas a tirarem sua lã e quando as tem somem, deixando-as com frio ao relento... já não tinha mais dúvida, foi ao seu encontro. Sedução não é despertar o desejo no outro? A criatura nascera com esse dom, seduzia com facilidade, por meio do andar, do olhar, da fala: Oi, quanto tempo! E o perfume veio junto com o abraço. Cabelo pintado, escovado, roupa colada, insinuante como sempre. Parecia que o tempo não tinha passado e que nunca estiveram distantes a não ser pela aliança de ouro na mão esquerda denunciando que alguém no tempo de ausência havia tomado o lugar que um dia achou que seria seu. Foram a um bar, tomaram uns copos, conversaram sobre a vida e não voltaram ao trabalho. Os celulares tocaram, voltaram a tocar e a tocar de novo, e, se não ouviram, fingiram, terminando o horário de expediente num quarto. Contatos não trocaram, novo encontro não marcaram, deixando a esmo qualquer nova possibilidade. Estavam saciados. Parecia que suas carências haviam sido acertadas. O táxi chegou, meio corpo no carro entrou, celular na mão, um olhar de despedida com um beijo no ar, fecha a porta,  ele fita sua silhueta indo embora, enquanto ela diz com voz doce ao fone: Amor, estou chegando! (J.S. e A.Z. Silva)